Por que só se fala na compra direta de títulos públicos?

Por Vitor Leitão

Os investimentos dos RPPS geralmente são feitos via fundos de investimentos. Estes são veículos que oferecem uma série de benefícios aos investidores: praticidade, agilidade, ganho de escala, profissionalização da gestão dos recursos, além de baixo custo. Até por isso a Resolução CMN nº 3.922/2010 praticamente direciona os investimentos dos RPPS para fundos.

Mas, então, por que tem se falado tanto na compra direta de títulos públicos? O que mudou? É realmente uma boa opção? E o que deve ser avaliado ao tomar uma decisão como essa?

Vou tentar, de forma sucinta, responder a estas que têm sido as perguntas mais ouvidas nas últimas semanas.

A recente elevação das taxas de juros – ou no jargão de mercado, a abertura da curva, mostrou que o investidor está exigindo mais retorno para investir em títulos públicos brasileiros, e isso é facilmente percebido ao consultarmos o site do Tesouro Direto1. Se voltamos no tempo, veremos que em setembro do ano passado era possível comprar uma NTN-B 2055 com remuneração de IPCA + 4% a.a. e uma NTN-F 2031 (prefixado) com remuneração fixa de 7,06% a.a. Quem quiser comprar estes mesmos títulos atualmente conseguirá retornos de IPCA + 4,86% ou 10,82%, respectivamente. Ou seja, os retornos oferecidos subiram bastante, gerando uma procura maior por esses títulos.

Para 2022, as metas atuariais, considerando o Anexo I da Portaria SPREV 6.132/2021, devem ficar entre 2,60% e 5,04% acrescidas de IPCA. Perceba, portanto, que uma NTN-B com vencimento em 2055 garante 96% da sua meta atuarial, com o menor risco do mercado. Além disso, as compras diretas de títulos públicos podem ser marcadas na curva zerando a volatilidade, isto é, esqueça o estresse do sobe e desce do mercado. Que maravilha! Temos aqui, então, uma oportunidade de risco mínimo, sem volatilidade e retorno satisfatório. “Melhor impossível!”, você pode estar pensando agora. Mas, calma!

Correr para “aproveitar o momento” pode ser muito bom para você, com seus investimentos pessoais, mas para você, gestor de RPPS, é preciso sempre lembrar dos princípios descritos no art. 1º da Resolução 3.922, os quais destaco a “adequação à natureza de suas obrigações”, a “diligência” e a adoção de “regras, procedimentos e controles internos que visem garantir o cumprimento de suas obrigações, respeitando a política de investimentos estabelecida, observados os segmentos, limites e demais requisitos previstos nesta Resolução e os parâmetros estabelecidos nas normas gerais de organização e funcionamento desses regimes”.

Aqui, chamo atenção para alguns pontos fundamentais que devem ser vistos antes da compra dos títulos:

(i) verifique se o seu Conselho aprovou alocação nesses títulos, que são enquadrados no Artigo 7º, inciso I, alínea “a”, da Resolução 3.922, na Política de Investimentos vigente;

(ii) leia o parágrafo quarto, do artigo 3º da Portaria MPS nº 519/2011 e, junto ao seu consultor de investimentos e atuário verifique a compatibilidade dos prazos desses títulos com as obrigações presentes e futuras do seu RPPS;

(iii) atente-se para a questão contábil, caso a decisão seja pela marcação na curva dos títulos, lendo o parágrafo segundo do art. 16 da Portaria 402/2008 e, principalmente, discutindo com seu contador a adequação da contabilidade do seu RPPS à Portaria SPREV nº 4/2018.

Crises geram oportunidades, isso é fato, mas estas só devem ser aproveitadas caso sejam apropriadas e dentro do rigor legal. Estamos tratando de recursos públicos, de anos de contribuição dos servidores que confiaram a você a gestão desses investimentos. Sua decisão pode até se mostrar eficiente do ponto de vista de retorno, mas, caso não cumpra os ditames legais, você certamente será cobrado no futuro. Não esqueça: cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém!

 

  1. O Tesouro Direto é um Programa do Tesouro Nacional desenvolvido em parceria com a B3 para venda de títulos públicos federais para pessoas físicas, de forma 100% online. As taxas utilizadas aqui foram apenas para referência.

 

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LEMA, consultoria de investimentos para todos os RPPS.