A IMPORTÂNCIA DA DILIGÊNCIA: UM EXEMPLO PRÁTICO

Nos últimos meses, a situação envolvendo o Banco Master ganhou ampla repercussão, seja pelos questionamentos sobre sua solidez financeira, seja pelas taxas elevadas ofertadas em títulos de sua emissão. Esse movimento fez com que a instituição ganhasse grande visibilidade e despertasse atenção de investidores, incluindo Regimes Próprios de Previdência Social, alguns dos quais possuemletras financeiras do banco em suas carteiras.

Um dos episódios mais marcantes da história recente do Banco foi a tentativa de aquisição por parte do BRB(Banco de Brasília), operação vetada pelo Banco Central em setembro. Já em novembro, veio à tona a negociação com o Grupo Fictor, ligado a um consórcio de investidores dos Emirados Árabes Unidos, que previa um aporte inicial de R$ 3 bilhões para reforçar a estrutura de capital da instituição. Entretanto, hoje, o Banco Central decretou a liquidação extrajudicial do banco e ontem, 17 de novembro, Polícia Federal deflagrou a prisão do principal controlador do Banco, o que acabou por encerrar as tratativas de venda e elevaram o risco de crédito associado ao emissor.

No caso de investidores que possuem CDBs do Banco Master, há cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) limitada a R$ 250 mil por CPF ou CNPJ. No entanto, no âmbito dos RPPS, os títulos bancários mais utilizados são, em geral, as letras financeiras,  que não contam com proteção do FGC, de modo que eventuais perdas decorrentes de eventos de crédito recaem integralmente sobre os recursos do investidor. Esse caso evidencia a necessidade de gestores de RPPS manterem postura diligente e criteriosa nas decisões de investimento.

É importante destacar que, para a seleção de emissor de título para aquisição direta pelo RPPS (Art. 7º, IV), deve ser observada a presença na lista exaustiva publicada pela Secretaria de Regime Próprio e Complementar, do Ministério da Previdência, lista essa em que consta o nome do Banco Master, uma vez que a instituição cumpre os requisitos estabelecidos no Inciso I, do § 2º do Artigo 21 da Resolução CMN nº 4.963/2021.

A presença nessa lista, porém, não elimina a necessidade de avaliação própria por parte do RPPS.  Elegibilidade normativa não significa segurança garantida, significa apenas que a instituição cumpre requisitos mínimos regulatórios. Dessa forma fatores como segmentação prudencial e rating são fatores fundamentais a serem considerados.

Assim, ainda que a lista exaustiva sirva como referência de conformidade, é imprescindível que a gestão do RPPS realize análise própria do emissor antes de deliberar pela alocação de recursos, especialmente no que diz respeito aorisco de crédito vinculado ao emissor, considerando ovolume a ser aplicado. 

Aspectos como aderência a norma, segmentação prudencial, rating, governança e possíveis sinais de estresse de liquidez devem ser observados, mas evidenciam elementos base da diligência necessária para mitigar riscos de crédito e de concentração a carteira do regime.

Nesse contexto, a LEMA elaborou, em julho de 2024, a “Nota Técnica Títulos de Emissão Bancária (Art. 7º, Inciso IV)”, com o objetivo de auxiliar os gestores dos RPPS na seleção de emissores e na definição de limites prudenciais por instituição. À época da elaboração do documento, o Banco Master estava classificado no Nível Prudencial S3 e possuía rating BBB, o que resultou na limitação de alocação máxima de até 0,75% dos recursos do RPPS, conforme metodologia própria elaborada. Para fins comparativos, instituições enquadradas no Nível Prudencial S1 e com rating AAA poderiam receber investimentos de até 15%.

Já ao considerarmos o rating atual (CC) emitido pela Fitch, o Master não estaria apto a receber recursos, haja vista a classificação de alto risco de inadimplência. Dessa forma, observa-se que não só a observação prévia àaplicação, mas o monitoramento constante, mostra-secomo essencial para o controle de riscos, ponderando ajustes à exposição conforme a evolução das condições financeiras de cada emissor.

Cabe ressaltar que, mesmo para essas instituições mais robustas, a Nota Técnica da LEMA recomendou limite inferior ao teto permitido pela Resolução nº 4.963/2021, que é de 20%. Essa redução teve como objetivo reforçar o controle de concentração por emissor e mitigar riscos sistêmicos, posicionamento que foi posteriormente corroborado pelo PARECER SEI Nº 146/2024/MPS, publicado em julho de 2024.

Dessa forma, é indispensável que os gestores adotem processos internos de avaliação que sejam consistentes edocumentados, visando a mitigação de riscos dos recursos previdenciários. A observação de eventos como oscilações atípicas nas taxas ofertadas, mudanças abruptas na estrutura societária, aumento de exposição na mídia erebaixamentos de rating deve servir como alerta para revisão de limites e reavaliação de exposição. A diligência, nesse sentido, deve ir além da análise meramente de cumprimento regulatório e envolver monitoramento das condições do emissor, das dinâmicas de mercado e do ambiente econômico, de modo a assegurar que a carteira previdenciária permaneça resiliente mesmo diante de eventos inesperados.

O episódio do Banco Master deixa uma lição: conformidade regulatória não substitui análise de risco, elegibilidade não é sinônimo de segurança e taxas elevadas tendem a refletir maior probabilidade de estresse financeiro do emissor. Para os RPPS, cuja responsabilidade é zelar pela sustentabilidade de longo prazo dos recursos previdenciários, a diligência deve ser contínua e criteriosa.